Há uns anos atrás as minhas incursões por terras de Barroso eram frequentes e ávidas de conhecer mais.
A conquista dos habitantes da zona, transmontanos áridos, foi lenta mas bem construída. A maior parte não conseguia entender o interesse mostrado pela sua terra.
Foi numa dessas alturas de troca de histórias e conhecimentos, normalmente com os anciãos sentados perto do pelourinho, que tomei conhecimento do Vinho dos Mortos.
Consumida pela curiosidade lá fui eu, rumo a Boticas, comer uma deliciosa truta num restaurante que já não existe e era também muito conhecido pelas suas rabanadas, que eu nunca consegui duplicar.
Logo a seguir ao repasto perguntei por quem vendesse o apetecido vinho. A custo e com alguma contrariedade lá segui um botiquense até à sua adega. Foi do chão da adega, de saibro, que ele retirou e sacudiu as 6 garrafas que lhe pedi que me vendesse.
Vindo para casa procurei por mais informação, que confirmou o que me tinham contado sobre este vinho.
Durante a 2ª Invasão Francesa (1808) e em face do avanço das tropas
comandadas pelo General Soult, que na sua passagem tudo saqueavam,
pilhavam e destruíam, a população de Boticas, para tentar defender o
seu património, decidiu esconder, enterrando, o que tinha de mais
valioso.
O vinho foi enterrado no chão das adegas, no saibro, debaixo
das pipas e dos lagares.
Mais tarde, depois dos franceses terem sido
expulsos, os habitantes recuperaram as suas casas e os bens que
restaram.
Ao desenterrarem o vinho, julgaram-no estragado. Porém,
descobriram com agrado que estava muito mais saboroso, pois tinha
adquirido propriedades novas. Era um vinho com uma graduação de 10º/11º,
palhete, apaladado, e com algum gás natural, que lhe adveio da
circunstância de se ter produzido uma fermentação no escuro a
temperatura constante.
Por ter sido “enterrado” ficou a designar-se por “Vinho dos Mortos” e passou a utilizar-se esta técnica, descoberta ocasionalmente, para melhor o conservar e optimizar a sua qualidade.
A técnica continua a ser usada, com êxito, até aos dias de hoje.
Na altura em que eu comprei as tais garrafas nem sequer havia rótulo. A produção era pouca e destinava-se ao consumo próprio e a alguns (poucos) restaurantes na zona.
Hoje em dia as condições de comercialização e reconhecimento do vinho mudaram drasticamente. As garrafas têm selo do Instituto do Vinho e da Vinha e um rótulo muito mais apelativo. E o vinho já é vendido online.
Veja mais nesta reportagem do Porto Canal.
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